sexta-feira, 19 de junho de 2009

Ame-as ou deixe-as

Vez em quando ainda encontro com uma arvorezinha dessas bem simpáticas. Mas já ressequidas, magras, velhas. Quando ainda dão seus frutos, são de um amarelo feito sorriso que não se quer dar.

As ameixeiras de hoje em dia se parecem com aquelas velhinhas, tão raras, tricotando nas varandas, deixando o tempo passar sereno. Quase não as vemos mais.

Quando cheguei por aqui, não havia casa de bairro que não tivesse em seu fundo um pé de ameixa, das amarelas. Ladeado a limoeiros espinhosos, de limão rosa – ou caipira, como dizem. Também alguns pés de pêssego ou jaboticaba.

Minha lembrança agora desta espécie de fruta, e as maravilhas da internet, me levaram a saber que se trata da nêspera. Este é o nome da nossa ameixa, e sua origem é chinesa. Nêspera. Seu maior produtor é o Japão, seguido por Israel e Brasil.

Lembrei. Tudo me veio à mente assistindo a Paradise Now, filme que conta a história de dois homens-bomba na Faixa de Gaza, em que notei na paisagem desértica da Palestina, a presença da ameixa amarela. Várias nespereiras, a cada cena. Pensei que, puxa vida, até no deserto tem ameixa, e aqui não mais.

Seus frutos amadurecem no final do inverno e início da primavera. Fazíamos a festa trepados nas suas árvores, entre um jogo de bulico e uma pelada contra a turma da rua de baixo, sujos em nossos kichutes. Encardidos como rezava a fama da nossa equipe.

Leminski deixou um haicai para a ameixa, de tantas que por certo via. “Ameixas / ame-as / ou deixe-as”. Uma bela tirada com o slogan dos militares que avisava “Brasil, ame-o ou deixe-o”, como um pequeno recado aos que estavam insatisfeitos com as agruras do regime.

Quem sabe a exportação de ameixa amarela nunca foi um forte na economia aqui da cidade, por sermos além de grandes produtores, também os seus maiores consumidores. Não me recordo de ver um pomar de ameixeiras. Era uma fruta de quintal, algo como um presente .

Vai lá foi um sábio oriental que largou a primeira semente, em tempo muito ido. Pode ter vindo curar algum polaco com tosse, dado que a Wikipédia me informa de novo que a fruta era usada como expectorante.

Sabiás de peito alaranjado ou amarelo, que lembro ver se alimentando nos pés de ameixa, devem ter espalhado as demais, daqui até os Campos Gerais.

Não sei por que elas sumiram. Imagino que pela urbanização desenfreada. Também não fui ao Google para tentar saber como realmente apareceram por aqui. Pra mim, elas surgiram no olhar, depois no paladar, e lá ficaram. Vezes que as vejo. Raro. Há uma ameixeira na praça do café atrás do Guaíra. Fincada no cimento, assiste a tudo estéril, sem frutos.

Se sábios ou sabiás, não sei. Amei-as sem perguntar. Deixei-as tal e qual.

Folha de Londrina (19/06/2009)


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5 comentários:

  1. Testaço, Jacobsen!
    Também vivo saudosa das ameixeiras.
    No Abranches tínhamos jaboticabeira, pessegueiro e limoeiro caipira (as melhores limonadas ... quase oleosas). As ameixas mais amadas vinham de uma árvore fronteiriça ao muro, no quintal da vizinha, Dona Deonilda.
    Abrassss

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  2. pois eu plantei um caroço de abacate no vaso. nasceu. vou replantar na rua. quero ver os abacates caindo em cima dos carros. coisa linda de se ver. vou comer uma jaca, daí tudo vai ficar certo. abraço.

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  3. Eh verdade, elas teem um sabor de infancia. Casca pilosa, a gente comia sem lavar e ficava com a boca cocando.

    Jaca eh tuuuudo de bom, aqui na Bahia vendem nna rua, e eu descobri que tem jaca mole e jaca dura. A dura faz menos estrago em termos de meleca, mas nao deixa de fazer. Qdo passo na banquinha, vem aquele cheiro nada discreto que me captura, e acabo commendo sem lavar tb.

    Nao se abandona habitos de infancia.

    bjos

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  4. Este comentário foi removido pelo autor.

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  5. Quando criança eu tinha um pé dessas do ladinho de casa, e eram uma delícia! Nêsperas docinhas deliciosamente saboreadas sentada nos galhos da árvore! Mas o tempo passou, a árvore precisou ser cortada pois estava danificando o piso da casa e agora em seu lugar existe uma bela(!?) horta. Também eu não estou mais lá... Volto as vezes, com menos frequência que gostaria.
    Hoje de manhã abri a janela do meu quarto de apartamento, e reparei em umas frutinhas amarelinhas que me deram água na boca, e saúdades de um tempo que não volta mais... Coinscidentemente vim parar neste blog e me deparei com o texto do Flávio! Ótimo!!!!

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